Nem Brás, nem Flores: hospedaria de imigrantes da cidade de São Paulo (1875-1886)
Na segunda metade do século XIX, leis abolicionistas, como a Lei Eusébio de Queiroz que impedia o tráfico negreiro, levaram os fazendeiros paulistas a buscar novas alternativas para suprir a necessidade de abastecimento de mão de obra. Uma das alternativas foi trazer europeus. As hospedarias de imigrantes desempenharam importante papel no processo migratório brasileiro, por ser local de transição de estrangeiros e nacionais após a longa viagem do seu ponto de origem ao seu destino. Entre o navio da Europa até a chegada às fazendas no interior paulista, as hospedarias de imigrantes foram importantes para acolhê-los, alimentá-los e direcioná-los para o trabalho, quer nas fazendas, quer nas cidades.
Nosso objetivo foi localizar hospedarias que não costumam ser elencadas pela historiografia e compreender a quem se destinavam, como se organizavam e quem as comandava. Através da análise textual e paleográfica da documentação oficial dos relatórios de Império e Província, da legislação, dos periódicos e de manuscritos do Arquivo Público do Estado de São Paulo e da historiografia localizamos hospedarias de imigrantes, de núcleos coloniais e de internação, que funcionaram entre 1875 e 1886. Consideramos que os cafeicultores paulistas, principais interessados em obter alternativas à mão de obra escrava, ficaram à frente na organização das hospedarias de imigrantes. Para se manter na organização das hospedarias, ora criaram associações de imigração, que se sucederam, ora atuaram como encarregados do governo. Também consideramos que as hospedarias de imigrantes, independentemente da localização, mantiveram a continuidade dos serviços, oferecendo três refeições diárias por até oito dias, prestando atendimento médico e funerário em caso de necessidade. Além da hospedaria de imigrantes, houve outras com funções diferentes como as que serviram para abrigar os que tinham por destino os núcleos coloniais e os que eram encaminhados para São Paulo, internados, para manter-se longe das ameaças de contrair doenças como febre amarela.
In the second half of the nineteenth century abolitionist laws such as the Law Eusebio de Queiroz which prevented slave trading, led São Paulo farmers to seek new alternatives to supply the need for manpower provision. One of these alternatives was to bring Europeans. The immigrants’ hostels played an important role in the Brazilian migratory process, by being a transition place for foreign and domestic workers after their long journey from their point of origin to their destination. A point between their departure from Europe and their arrival at the inland farms, the immigrants’ hostels were important to welcome them, feed them and direct them to work either on farms or at the city. Our goal was to find hostels that are not usually listed by historiography and understand to whom they were intended, how they were organized and who controlled them. Through textual and paleographical analysis of official documentation of the Empire and Province reports, of legislation, of periodicals and manuscripts from the Arquivo Público do Estado de São Paulo and of historiography we located immigrants’ hostels, of colonial settlements and internalization, which ran between 1875 and 1886. We believe that Paulistas coffee planters, key stakeholders in obtaining alternatives to slave labor, were ahead in the organization of these immigrants’ hostels. To keep controlling these hostels, sometimes they created immigration associations that followed, sometimes they acted as government tenders. We also consider that the immigrants’ hostels, regardless their location, maintained the continuity of services, offering three meals a day for up to eight days, and providing medical and funeral assistance when needed. Besides the immigrants’ hostel, there were others with different functions, such as those that sheltered immigrants who were destined for the colonial settlements and who were sent to São Paulo, interned, in order to keep them away from the threats of contracting diseases such as yellow fever.